A nutrição nos primeiros 1000 dias de vida

Existe um período crítico no qual os investimentos para assegurar uma nutrição adequada são decisivos na vida de todo indivíduo. Os 1000 dias que compreendem desde o início da gestação (nove meses) até o segundo aniversário na vida de uma criança é o período conhecido como janela de oportunidades, por ser uma oportunidade única para assegurar um futuro mais saudável e próspero, tanto no nível individual como coletivo (WHO, 2013; Hoddinott et al, 2012; The World Bank et al, 2010). A nutrição adequada nestes 1000 dias representa um enorme impacto na capacidade de esta criança crescer, aprender, se desenvolver e ter uma vida próspera. Também tem um efeito profundo na saúde no longo prazo, na estabilidade social e no desenvolvimento de comunidades e nações inteiras (The World Bank et al, 2010).

Damos ênfase ao aleitamento materno como garantia de excelência na nutrição durante os dois primeiros anos de vida. O aleitamento materno é a primeira prática alimentar dos indivíduos e se relaciona com a saúde ao longo de toda a vida. É a mais sábia estratégia natural de vínculo, afeto, proteção e nutrição para a criança. Amamentar é muito mais do que nutrir. É um processo que permite a profunda relação entre mãe e filho, com repercussões no estado nutricional da criança, em sua habilidade de se defender de infecções, em sua fisiologia e no seu desenvolvimento cognitivo e emocional, além de ter implicações na saúde física e psíquica da mãe também (Brasil, 2009).

O aleitamento materno exclusivo até o sexto mês de vida e continuado até pelo menos os dois anos de idade está relacionado com a diminuição da mortalidade infantil, a redução na incidência de doenças infecciosas na infância, a diminuição nas prevalências de obesidade e doenças crônicas (hipertensão, diabetes, doença cardiovascular, etc) tanto na infância como na vida adulta, e até mesmo com um maior coeficiente intelectual (OPS, UNICEF, PMA, 2009; Gonzalez, 2009; León-Cava et al, 2002; Uauy et al, 2008; WHO 2013; Bhutta et al 2013). Além desses extensos benefícios, para a mãe que amamenta o aleitamento materno representa uma prevenção ao câncer de mama e ovário, além de diminuir o risco de fraturas por osteoporoses e a perda de ferro (Gonzalez, 2009; León-Cava et al, 2002).

No Brasil, 95% das crianças brasileiras foram alguma vez amamentadas, mas esse número cai drasticamente ao longo dos dois primeiros anos de vida. Segundo dados de pesquisas recentes, a mediana de aleitamento materno exclusivo no Brasil é de apenas 54 dias, e mediana do aleitamento materno total, que deveria ser de 24 meses, é pouco maior que onze meses (Brasil, 2011). Atualmente, a prevalência do aleitamento materno exclusivo em menores de seis meses é de 41% (Brasil, 2011), valor que ainda precisa ser incrementado para assegurar uma ótima nutrição infantil.

A transição do aleitamento materno para os alimentos consumidos pela família é o período denominado como alimentação complementar. É um processo que se inicia aos seis meses de idade e dura até os 24 meses. O aconselhamento para uma adequada alimentação complementar também é considerado uma das ações essenciais em nutrição para melhorar a saúde e o desenvolvimento infantil (WHO 2013). Este é um momento delicado no qual a introdução de alimentos deve ser feita em tempo oportuno e em quantidade e qualidade adequadas a cada fase do crescimento e desenvolvimento infantil. Durante a alimentação complementar são adquiridos e formados os primeiros hábitos alimentares, e a correta alimentação tem o papel de promoção à saúde e hábitos saudáveis, além de proteger a criança de deficiências de micronutrientes e de doenças crônicas na idade adulta (Brasil, 2011).

Vantagens da amamentação exclusiva até o sexto mês e continuada
até pelo menos os dois anos de idade:

  • Evita mortes infantis
  • Evita diarreia
  • Evita infecção respiratória
  • Diminui o risco de alergias
  • Diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes
  • Reduz a chance de obesidade
  • Melhor nutrição
  • Efeito positivo na inteligência
  • Melhor desenvolvimento da cavidade bucal (fundamental para o alinhamento correto dos dentes e uma boa oclusão dentária)
  • Proteção contra câncer de mama
  • Diminui riscos de fraturas por osteoporose
  • Diminui a perda de ferro e evita nova gravidez precoce
  • Menores custos financeiros
  • Promoção do vínculo afetivo entre mãe e filho
  • Melhor qualidade de vida

Fonte: Elaboração própria a partir de: Gonzalez, 2009; Brasil, 2009; León-Cava, 2002; PAHO, 2009; Bhutta et al, 2013; WHO, 2013.

 

Referências Bibliográficas
Bhutta Z, Ahmed T, Black R, Cousen S, Dewey K, Giugliani E et al. What works? Interventions for maternal and child undernutrition and survival. Maternal and Child Undernutrition Series. The Lancet 2008; 371: 417-40.
Bhutta ZA, Das JK, Rizvi A, Gaffey MF, Walker N, Horton S, Webb P, Lartey A, Black RE; The Lancet Nutrition Interventions Review Group, and the Maternal and Child Nutrition Study Group. Evidence-based interventions for improvement of maternal and child nutrition: what can be done and at what cost? Lancet. 2013 Jun 6. doi:pii: S0140-6736(13)60996-4. 10.1016/S0140-6736(13)60996-4.
Black R, Allen L, Bhutta Z, Caulf L, Onis M, Ezatti M et al. Maternal and child undernutrition: global and regional exposures and health consequences. Maternal and Child Undernutrition Series. The Lancet 2008; 371: 243-60.
Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Saúde da criança: nutrição infantil: aleitamento materno e alimentação complementar / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília : Editora do Ministério da Saúde, 2009.
González C. Un regalo para toda la vida: guía de lactancia materna. Madrid, Ed Temas de Hoy, 2009.
González C. Mi niño no me come. Madrid, Ed Temas de Hoy, 2011.
León-Cava N, Lutter C, Ross J, Martin L. Cuantificación de los beneficios de la lactancia materna: reseña de la evidencia. Washington, Organización Panamericana de la Salud, 2002.
PAHO, WHO. 49th Directing Council, 61st Session Of The Regional Committee Panamerican Health Organization and World Health Organizacion. Washington DC,  28 Sept – 02 Oct, 2009. Executive Summary: Pan American Alliance for Nutrition and Development for the Achievement of the Millennium Development Goals. Washington DC, 2009.
WHO. Essential Nutrition Actions: improving maternal, newborn, infant and young child health and nutrition. Geneva, 2013.